HERÓIS EM CENA: A CONSTRUÇÃO PARADIGMÁTICA CONTRACULTUAL DA MESOCRISTOLOGIA JOANINA.

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Danilo Dourado Guerra

Resumo

Esta investigação tem como objeto de pesquisa a homologese (confissão) da encarnação do herói, em Jo 1,14. Utilizando-se de um referencial metodológico analítico diacrônico-sincrônico do tipo pendular, objetiva-se efetuar o rastreamento exegético-reconstitutivo do conteúdo cristológico implícito em Jo 1,14 e a sua interface com o contexto sociorreligioso vivenciado pelos grupos joaninos. Diante desta demanda, a hipótese a ser demonstrada é que o discurso da encarnação do herói joanino, estruturado dentro de uma poética sequencial do prólogo, repercute a saga cristológica da comunidade e revela a configuração genético-noemática da mesocristologia joanina. Trata-se de um modelo protocristológico que se faz construção heterotópica e teo-política em relação à apoteose romana, e, por conseguinte, estabelece-se como construto cristolátrico, cristocêntrico e paradigmático em relação ao culto imperial e às estruturas teatrocráticas engendradas neste. O alcance desta hipótese arquiteta-se, por sua vez, a partir do enredo poético kierkegaardiano, no qual, categorias analíticas como o herói, o teatro e o poeta encontram-se imbricadas em cena. Nesse contexto, a empresa reconstitutiva da saga cristológica do herói joanino desenha-se na trilha hermenêutica da indecidibilidade e da imaginação criativa, nutrindo-se, sobretudo, da teoria das fontes de Senén Vidal e do referencial heterotopológico foucaultiano, o qual permitiu-nos visibilizar cada passo cristológico da comunidade contingencialmente explicitado na trama de cada capítulo a partir do enredo metafórico do barco joanino a navegar no mar do cosmos-Império. À luz do enredo foucaultiano, no primeiro capítulo, emerge-se de forma direta no primeiro passo da saga. Este trata acerca do herói-rei e o reino. Nessa trama, tendo como referencial exegético as Tradições Básicas joaninas e, sobretudo, o fragmento Jo 18,36, versa-se acerca do processo de construção da cristológica real joanina, a partir dos paradigmas do herói-rei e sua basileia, visibilizando-se, neste encadeamento, o background de contingências, desafios e efeitualidades que se relacionam com este momento incipiente da história dos grupos joaninos. Nesse encadeamento se delineia a tese de que o conteúdo cristológico do fragmento textual Jo 18,36, subsidiado pela anamnese monumental do herói-rei, evidencia a maturação e consolidação de um processo de ressignificação do messianismo davídico popular joanino e, por conseguinte, postula, a partir de uma síntese dialética entre os substratos cristológicos do rei e da basileia, a complexa e incipiente dynamis construcional paradigmática do modelo protocristológico real joanino. Diante do círculo concêntrico em que se materializa o cosmos no QE, o teor ressignificado da cristologia real joanina, de um lado, visibiliza o viés heterotópico dos grupos joaninos perante as práticas de dominação do Império Romano, de outro, se configura como vetor dos embates messianológicos com o judaísmo rabínico e consequentemente como elemento catalisador da expulsão dos grupos joaninos da sinagoga. O segundo capítulo, por sua vez, remete ao segundo passo da saga. Este revela a interface entre o herói e a glória. Neste contexto, tendo como referencial exegético o fragmento hínico-poético Jo 1,1, versa-se acerca da dinâmica de elaboração da cristologia da glória do herói joanino. Diante deste tablado, objetiva-se evocar fundamentalmente, a partir do cruzamento imagético-simbólico (Jesus-César), uma arqueologia da glória, que por sua vez, evidencie as instâncias e fios paradoxais que orbitam o processo prototípico de construção da divindade e do culto a Júlio César, e a dynamis de compreensão acerca da divindade e da devoção ao Jesus joanino. Nessa trama epistêmica, os substratos arqueológicos coletados em terras italianas e gregas configuram-se em alicerces históricos ratificadores da hipótese proposta. Nesse trajeto se delineia a tese de que na dinâmica poética do prólogo joanino, os três atos do drama cosmológico do herói, em Jo 1,1 (Jo 1,1a; Jo 1,1b; Jo 1,1c), evidenciam a construção paradigmática do modelo protocristológico da glória, no qual o herói joanino é compreendido como Theos diante de uma atmosfera de pressão cultual sob Domiciano. Este modelo protocristológico, por sua vez, designa a estruturação de uma plataforma protocultual neomonoteísta de cunho ideológico anti-idolátrico e anti-politeísta diante de um iceberg piramidal cultual teatrocrático gestado matricialmente em César e travestido no culto domiciano. Por fim, o terceiro e último capítulo aborda o passo final da saga cristológica joanina. Este revela a relação entre o herói, o reino e a glória. Nessa paisagem textual, tendo como referencial exegético Jo 1,14, trata-se acerca da construção genético-paradigmática do modelo protocristológico mesocristológico, das suas implicações em relação à apoteose romana e a instituição paradigmática do culto imperial no seio joanino, bem como da história dos efeitos e sintagmas intrínsecos ao caráter heterotópico da mesocristologia joanina. Neste último passo se evidencia a tese principal de que este neoprotótipo cristológico sintético, no qual os modelos cristológicos real/horizontal e da glória/vertical orbitam e se ressignificam dialeticamente, institui-se como construção heterotópica e teo-política em relação aos ritos de apoteose romana, e, por conseguinte, se estabelece como construto cristolátrico, cristocêntrico e paradigmático em relação ao culto imperial e às teias teatrocráticas imbricadas neste. Esta tese, por sua vez, tem como escopo basilar explicitar que o cristianismo originário joanino instaura-se como protótipo cristológico-cultual cristolátrico que kerigmatiza e reivindica uma práxis devocional centralizada em Jesus. Nesse sentido, a gens mesocristológica, implícita no discurso encarnacional do herói joanino, implanta-se como construto homologético paradigmático em relação a qualquer práxis divinizante e cultual, forjada teatrocraticamente sob dispositivos hermenêuticos não cristocêntricos ao longo da história. Este modelo investigativo nos permite questionar em que proporção o protótipo paradigmático devocional e, por conseguinte, contracultual joanino tem sido subvertido ou negligenciado, por uma parte, pelas dinâmicas e faces do poder que continuam a fabricar devotos, deuses-heróis e seus respectivos cultos no decorrer dos tempos e sociedades; por outra parte, na medida em que, antigas e novas dinâmicas devocionais e cultuais de caráter não cristocêntrico, a partir de uma apropriação prototípico-simbólica gestada em César, tem se estabelecido mimeticamente na história eclesiástica dos cristianismos ao longo dos tempos.

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Como Citar
GUERRA, D. D. HERÓIS EM CENA: A CONSTRUÇÃO PARADIGMÁTICA CONTRACULTUAL DA MESOCRISTOLOGIA JOANINA. Caminhos - Revista de Ciências da Religião, Goiânia, Brasil, v. 16, n. 2, p. 225–230, 2018. DOI: 10.18224/cam.v16i2.6769. Disponível em: https://seer.pucgoias.edu.br/index.php/caminhos/article/view/6769. Acesso em: 28 mar. 2024.
Seção
Resumo expandido de Teses Defendidas / Theses Defended
Biografia do Autor

Danilo Dourado Guerra, Seminário Teológico Batista Novo Mundo; Faculdade Araguaia (Goiânia-GO)

Mestrado (2015) e doutorado (2018) em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, com estágio doutoral sanduíche na Università Degli Studi di Padova, Itália (2017). Bacharelado em Teologia pelo Seminário Teológico Batista Nacional - SETEBAN-GO (2009-2011) e pela Faculdade da Igreja Ministério Fama-FAIFA (2012-2012). Atualmente é professor do Seminário Teológico Batista Novo Mundo e conteudista do curso de Licenciatura em Teologia da Faculdade Araguaia.